O mês de Janeiro terminou com a primeira ronda de
reuniões entre o Governo Regional dos Açores e os partidos políticos, sobre o
processo de revisão do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores.
Esta ideia já tinha sido lançada, no ano passado,
pelo Presidente do Governo Regional no seu discurso
aquando das celebrações do Dia da Região, onde apresentou 3 pontos essenciais
para discussão e revisão:
1. Composição
da Assembleia abrindo a possibilidade de haver candidaturas subscritas por
listas de cidadãos independentes à Assembleia Legislativa da Região, bem como um
sistema de listas abertas;
2. Organização
administrativa apresentando uma alteração às competências dos Conselhos de
Ilha, que passariam a ter poderes executivos;
3. Modelo
constitucional da nossa Autonomia onde é defendida, claramente, a extinção
da figura do Representante da República, sendo considerada a possibilidade se
vir a criar um outro órgão regional em sua substituição.
Destes três pontos, e tendo em conta o que tem saído
nos jornais, os partidos que foram ouvidos até ao momento e que são os mesmos
que têm assento parlamentar, apenas comentam a extinção da figura do
Representante da República e a transformação dos Conselhos de Ilha em “Governos
de Ilha”, sendo que sobre este último referem unicamente que são contra. Até ao
momento, apenas o PPM se manifestou a favor da possibilidade de haver listas
eleitorais subscritas por cidadãos independentes e do sistema de listas
abertas.
Relativamente ao primeiro ponto, devo saudar entusiasticamente
a intenção de abrir as candidaturas a listas de cidadão independentes. Apesar
de esta possibilidade estar sujeita, não só à revisão do nosso Estatuto
Politico - Administrativo, mas também à revisão da Lei eleitoral, que não depende
de nós, mas sim do Governo Central, celebro o facto de começar a haver partidos
que finalmente percebem que a democracia só funciona quando os cidadãos
participam activamente na vida politica.
No que diz respeito às listas abertas, e uma vez que
a ideia é que seja o eleitor, no dia das eleições, a ordenar os candidatos das
listas de acordo com a sua preferência, corremos o risco de aumentar ainda mais
as taxas de abstenção e o número de votos nulos. Imaginem-se numa cabine de
voto a ter que ordenar todos os candidatos de todos os partidos… Pois é, à
terceira escolha já desisti.
Para melhorar a democracia, aumentar a participação
cívica e diminuir as taxas de abstenção, porque não começar por implementar o
voto electrónico? Ou abrir ao debate público os assuntos que são fundamentais
para o desenvolvimento, progresso económico e protecção dos recursos da Região,
com orçamentos participativos, por exemplo.
Quanto à questão da organização administrativa, que
se centra exclusivamente na transformação dos Conselhos de Ilha em órgãos executivos,
a posição de todos os partidos ouvidos é contrária à do partido do Governo.
Vejamos, o Conselho de Ilha é um órgão consultivo composto
pelos Presidentes das Assembleias e das Câmaras Municipais, quatro membros eleitos
por cada Assembleia Municipal, três Presidentes de Junta de Freguesia, um
representante do Governo Regional e representantes do sector empresarial, de
movimentos sindicais, associações agrícolas e do sector das pescas, IPSS e da
Universidade. Todas as sensibilidades da sociedade civil estão representadas no
Conselho de Ilha.
Considerando as propostas apresentadas pelo
Presidente do Governo Regional, estes Conselhos de Ilha passariam a ser eleitos
e a ter competências executivas transferidas dos municípios das respectivas
ilhas e competências delegadas pelo Governo Regional.
Se se pretende que não haja um aumento de órgãos
políticos nem de burocracia institucional, será que a intenção desta proposta é
extinguir as Câmaras Municipais e as Juntas de Freguesia?
Se a intenção é essa, julgo que este debate acaba
antes de começar, pois para isso teria que haver uma alteração completa do
actual panorama da administração local, com mais outra reforma, desta feita bem
mais profunda e arriscada, e não me parece que seja praticável.
Finalmente, o modelo constitucional da Autonomia,
todos são da opinião de que o cargo do Representante da República deve ser extinto,
entre outras razões, porque não é eleito, mas sim nomeado pelo Presidente da
República. No entanto defendem a necessidade de se esclarecer a quem devem ser atribuídos
os seus poderes. Por exemplo, o PSD defende a criação de um Presidente dos
Açores e o CDS-PP pergunta se esses poderes passarão para o Presidente da
Assembleia Legislativa Regional.
Gostaria de chamar a atenção para os poderes
do Representante da República. Muito resumidamente ele:
Nomeia
o Presidente do Governo Regional; Nomeia e exonera os membros do Governo
Regional; Assina e envia para publicação os Decretos Legislativos Regionais
(DLR); Exerce o direito de veto e pode pedir a fiscalização preventiva da
constitucionalidade de qualquer norma de DLR.
Sendo estes os poderes do Representante da República
e se temos um Presidente da República, eleito por sufrágio universal, que tem
os mesmos poderes a nível nacional, parece-me redundante esta duplicação de
funções e de figuras do Estado.
O debate sobre a revisão do Estatuto
Político-Administrativo da RAA ainda vai no adro, mas já fez correr alguma
tinta. É importante que se alargue a toda a sociedade civil e que quem quiser
participar, tenha verdadeiramente essa possibilidade. As sessões de
esclarecimento e de debate, que se devem realizar em todas as Ilhas do
Arquipélago, devem ser amplamente divulgadas, de modo a que haja uma
participação activa e construtiva, porque estamos a falar, essencialmente em
dois dos pontos, em questões que podem alterar, esperemos que positivamente, o funcionamento
da politica e a intervenção cívica de cada um de nós.
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