terça-feira, 13 de setembro de 2016

Em defesa da central de vermicompostagem do Nordeste


Foi publicada ontem a notícia de que pode vir a ser encerrado o serviço de vermicompostagem de resíduos urbanos da Câmara Municipal do Nordeste.
Esta notícia surge no mesmo dia em que foi assinada a adesão da Câmara Municipal do Nordeste à AMISM (Associação de Municípios da Ilha de São Miguel). Segundo o presidente da Câmara do Nordeste, a decisão de encerramento da vermicompostagem cabe agora à MUSAMI, a empresa intermunicipal que gere o Ecoparque da Ilha de São Miguel.
A MUSAMI/AMISM é também a maior dinamizadora da construção de uma grande incineradora de resíduos sólidos na Ilha de São Miguel. Contra os protestos de associações ecológicas e as críticas de partidos políticos, o processo de construção da incineradora tem avançado gradualmente, estando a decorrer o processo de adjudicação. Depois de entrar em funcionamento, uma incineradora necessita de um aporte constante de material. Por essa razão, estes equipamentos contrariam as soluções de redução, reutilização e reciclagem que se impõem no atual quadro civilizacional e que são recomendadas pelas entidades internacionais, como a Comissão Europeia.
Devido ao seu compromisso com a incineração, tememos que a AMISM se oponha a soluções suaves e sustentáveis para o problema dos resíduos sólidos urbanos na ilha de São Miguel, mesmo àqueles que têm demonstrado bons resultados.

A vermicompostagem é um processo no qual são utilizadas minhocas para acelerar a conversão de matéria orgânica em composto, que pode depois ser utilizado como adubo. A compostagem de resíduos orgânicos urbanos é correntemente utilizada em muitos países europeus. Na Holanda, por exemplo, 90% dos resíduos orgânicos domésticos são atualmente transformados em composto.
A central de vermicompostagem do Nordeste, inaugurada em julho de 2011, representou um investimento de mais de 2 milhões de euros e trata os resíduos sólidos de todo o concelho, tendo ainda capacidade de expansão.Como motivos para o encerramento são apontados, na notícia de ontem, os custos da operação e os alegados índices elevados de metais pesados que impossibilitariam a utilização do composto em culturas para consumo humano.
Consideramos que a gestão de resíduos sólidos deve cumprir ou exceder as normas europeias, principalmente num ecossistema tão delicado como o açoriano. Assim, opomo-nos à construção da incineradora e defendemos que os custos não devem ser analisados unicamente numa perspectiva de operação, mas em todo o ciclo de tratamento e aproveitamento de resíduos, incorporando os custos ambientais e de saúde. Defendemos ainda que os processos de operação da central de compostagem devem ser continuamente monitorizados para garantir a produção de composto saudável e passível de ser utilizado em qualquer cultura.

O LIVRE-Açores repudia portanto o encerramento da central de vermicompostagem do Nordeste, e manifesta o seu apoio a todas as iniciativas que visem manter esta infraestrutura.

domingo, 10 de julho de 2016

Políticas Climáticas para os Açores

De acordo com o relatório do IPCC (Intergovernamental Panel on Climate Change) mais recente (2013), é muito provável que a temperatura global da atmosfera continue a aumentar durante todo o século XXI em consequência da emissão continuada de gases com efeito de estufa, a maioria de origem fóssil. Este aumento de temperatura não é homogéneo, prevendo-se consequências diferentes em regiões diferentes do globo. No caso particular dos Açores e num cenário de emissões otimista (RCP2.6), as previsões de vários modelos apontam para que um aumento anual da temperatura do ar à superfície entre 1 e 1.5ºC até o final do século relativamente ao período pré-industrial (1861-1890), com exceção da primavera onde se prevê um aumento entre 0.5 e 1ºC. Neste cenário, a precipitação de larga escala será inferior a 10% do valor anual de referência, exceto no inverno onde será 10% maior. A humidade relativa à superfície deverá observar um aumento de 1%. No entanto, estas previsões não consideram os efeitos locais da topografia das ilhas, que poderão amplificar ou atenuar as alterações de larga escala, nomeadamente nas nuvens e precipitação de origem orográfica.
De acordo com o IPCC, os eventos de precipitação extrema tem aumentado globalmente. Este aumento é explicado pelo acréscimo no conteúdo em vapor de água na atmosfera que resulta do aumento da temperatura. Os dados históricos mostram que para os Açores este aumento não é evidente, mas de acordo com as projeções do IPCC (CMIP5) espera-se um aumento da intensidade e da frequência destes eventos durante o este século.
Relativamente aos ciclones tropicais, os registos históricos não apresentam uma alteração significativa durante o século XX. Contudo, as projeções do CMIP5 sugerem que o índice de potência dissipada dos ciclones tropicais no Atlântico Norte (PDI) deverá aumentar durante o século XXI.
As políticas climáticas nas áreas da gestão da água, solos, recursos marinhos, florestais e agrícolas em que aproveitar e respeitar as condições naturais das ilhas apresentam na sua maioria um caráter consensual. Outras áreas haverá, no entanto, que implicarão maior debate político, como resíduos, transporte e turismo.
Embora a problemática das alterações climáticas seja de âmbito global, cabendo a cada região contribuir igualmente para a redução das emissões de gases com efeito de estufa, nem todas as regiões sofrerão da mesma maneira estas alterações. Por exemplo, haverá regiões onde as alterações climáticas levarão a uma profunda desertificação e outras onde poderão estar sujeitas a cada vez mais e maiores inundações. Haverá outras onde o aumento de temperatura terá vantagens do ponto de vista agrícola e outras onde será francamente negativo, causando graves prejuízos. Os Açores são uma daquelas regiões onde o balanço destes impactos é francamente negativo. Neste contexto, as medidas adaptativas deverão ter preferência sobre as de mitigação porque do ponto de vista financeiro o impacto das alterações climáticas nas ilhas será maior que o esforço necessário para a redução das emissões dos gases com efeito de estufa.
A atual Estratégia Regional para as Alterações Climáticas (ERAC) publicada em 2011 necessita de ser revista à luz dos resultados do último relatório do IPCC (AR5) e das medidas acordadas no COP21. Por outro lado, o Plano Regional para as Alterações Climáticas (PRAC), o qual constituirá o principal instrumento para a implementação dessa estratégia, encontra-se atualmente em preparação, possivelmente com base nos resultados disponíveis na ERAC de 2011, ou seja, com base em informação de base com mais de 10 anos. Na verdade, as projeções que serviram de referência na elaboração do ERAC foram publicadas há mais de uma década (Climate Change Scenarios in the Azores and Madeira Islands, 2004), havendo por isso um desfasamento significativo entre o estado da arte e a informação climática de base.
No plano das medidas de adaptação, estas deverão ser analisadas de acordo com os impactos previstos nos vários sistemas sujeitos a riscos climáticos, nomeadamente sistemas físicos (ex: ribeiras, lagoas, cheias, secas, erosão costeira, etc), biológicos (ecossistemas terrestres, marinhos, incêndios florestais, etc) e humanos (produção de alimentos, populações, saúde, economia, etc.).
Existem alguns exemplos recentes de sistemas que foram significativamente afetados devido a situações cuja extensão e intensidade só se justificam num clima alterado. No caso dos Açores, é necessário avaliar situações recentes que possam ser atribuídas a alterações climáticas e identificar medidas de adaptação específicas com base nas projeções mais atualizadas e nos cenários mais prováveis.
Hoje, a sociedade açoriana é desafiada a uma muito maior participação na discussão, definição e implementação de políticas que deverão determinar a sua boa qualidade de vida futura!

segunda-feira, 13 de junho de 2016

Porque sou candidato às primárias

@s açorian@s estão afastados da política, como o evidencia qualquer indicador. A participação nas eleições legislativas regionais, por exemplo, tem vindo a decrescer ao longo do tempo. Nos anos 1990 a participação eleitoral rondou os 60%; decaiu para os 50% na década passada e entrou na casa dos 40% nesta década. Em 2012, em plena crise financeira e com o desemprego a atingir valores recorde, menos de metade d@s açorian@s votaram.
É fácil colar a estes números a etiqueta de falta de civismo, culpar as pessoas por não cumprirem os seus deveres, fazer campanhas de apelo ao voto. Esta visão transfere para o eleitorado uma culpa que deve ser procurada no sistema político. As pessoas não votam porque estão convencidas de que o seu voto não muda nada. E não se pode culpá-las por pensarem assim.
No plano global, mas também no europeu e nacional, forças poderosas manietam os governos, sabotando a democracia. Alguns exemplos: os interesses dos combustíveis fósseis impedem o desenvolvimento de energias renováveis e estão a precipitar o planeta para o caos climático; os acordos de livre comércio inundam as lojas de produtos baratos, impedindo o desenvolvimento de economias locais; o Pacto de Estabilidade e Crescimento impõe uma austeridade sangrenta aos povos europeus periféricos, com o único objetivo de manter os privilégios da alta finança. Os próprios políticos nos dizem que não há alternativa, que é Bruxelas que não deixa, que os “mercados” não podem ser assustados.
Não admira, portanto, que as pessoas se desinteressem da política: a realidade mostra que o voto é irrelevante. É o próprio ministro das finanças alemão que o confirma: “As eleições não mudam nada.”
Não temos que aceitar este estado de coisas! O Estado serve para defender os direitos de todos contra a hegemonia de poderosos de qualquer quadrante. E se o Estado está prisioneiro de interesses oligárquicos, é preciso re-ganhar o controlo democrático. Este é o combate do século, e decorre em várias frentes. Neste momento, em que se preparam as eleições legislativas regionais, a batalha é a de contribuir para que as açorianas e açorianos possam escolher os seus representantes políticos de forma transparente, sem a intermediação dos aparelhos partidários.
O LIVRE é o único partido que oferece esta possibilidade. Todas as pessoas que defendem uma política progressista, igualitária e ecológica para a Região são convidadas a apresentar as suas propostas e a vê-las sufragadas de forma direta e transparente. E todas as pessoas que partilhem estes princípios e quiserem contribuir com o seu voto para conferir mais representatividade ao processo das primárias podem registar-se para votar nos cadernos eleitorais.
Este é um momento histórico para a democracia nos Açores, e eu quero fazer parte dele.

domingo, 5 de junho de 2016

Primárias abertas para as eleições legislativas regionais

Neste Dia Mundial do Ambiente, damos início ao processo de primárias abertas para a escolha dos candidatos do LIVRE às eleições para a Assembleia Legislativa Regional dos Açores!

Qualquer cidadão na plenitude dos seus direitos e que se identifique com os ideais do LIVRE pode apresentar a sua candidatura. Convidamos por isso todos os cidadãos e cidadãs com ideias para os Açores e que defendam uma política progressista, igualitária e ecológica para a região a apresentarem-se como candidatos.

Qualquer cidadão residente ou recenseado nos Açores pode também participar na votação e na escolha dos candidatos do LIVRE às eleições regionais.

Todo o processo pode ser acompanhado em acores.livrept.net

terça-feira, 12 de abril de 2016

Um mundo para as pessoas

Muitos partilham da noção de que antes da Revolução Industrial as pessoas trabalhavam muito e tinham pouco conforto. Este estereótipo pode ser debatido mas é inquestionável que, graças à tecnologia moderna, existem tratores para aliviar o trabalho do campo, barcos a motor para tornar a pesca mais rentável, teares mecânicos para fazer tecidos, máquinas para costurar as roupas e para as lavar, carros, camiões, comboios e aviões para facilitar o transporte de pessoas e cargas. Não era suposto, portanto, estarmos a descansar?

E de facto as máquinas tiram o trabalho às pessoas. No entanto, isso é visto como uma catástrofe, porque sem trabalho não podemos garantir a nossa subsistência.

No entanto o valor continua a ser produzido. Uma fábrica compra uma nova máquina e consegue fazer o mesmo número de produtos com metade dos trabalhadores: a faturação mantém-se mas as despesas com pessoal diminuem. Há portanto mais lucro para os donos da fábrica, mas os trabalhadores despedidos deixam de ter meios para sustentar a sua família.

Este fenómeno repete-se por todo o lado: as caixas multibanco dispensam os bancários; o transporte em massa substitui as mercearias por hipermercados onde nem para receber o dinheiro são precisas pessoas.

O que fazer? Destruir as máquinas? Devemos lutar pelo privilégio duvidoso de ter pessoas a fazer aquilo que poderia ser feito pelas máquinas?

E porque não o contrário: usar as mais valias geradas pelas máquinas para proporcionar uma vida decente àqueles que elas dispensaram? Uma política que se preocupasse verdadeiramente com as pessoas encontraria forma de atribuir um rendimento básico a todos os cidadãos.

Como o nome indica, esta é uma contribuição atribuída pelo Estado a todos os cidadãos, sem qualquer condição prévia, num montante que permita um nível de subsistência digno. Uma forma de o fazer seria encarar a sério a redistribuição dos rendimentos por via dos impostos, ao mesmo tempo que, a prazo, se reduzem os gastos com muita assistência social.

O Rendimento Básico Incondicional é uma ideia que está a ser implementada na Finlândia (onde uma experiência de dois anos para atribuir até 1,000€ por mês a 100,000 cidadãos começará em 2017) e a ser discutida muito seriamente em países como a Suíça (que fará um referendo em Junho para atribuir 2,200€ por mês a cada cidadão) e em cidades da Holanda a Espanha.

Esta é uma ideia cujo tempo está a chegar.


José Azevedo
Açoriano Oriental, 12 abril 2016

quarta-feira, 23 de março de 2016

Base das Lajes - Os perigos do improviso


O recente relatório do Departamento de Defesa Norte Americano é claro no que diz respeito à Base das Lajes: tem valor estratégico, mas neste momento não se justifica manter lá um contingente militar. Cada dia parece menos provável que cheguem a bom porto os esforços das autoridades portuguesas para manter a utilização americana da Base das Lajes.

O fracasso das negociações, patente neste relatório, teve o seu início na década de 90, altura em que Portugal, tendo começado a receber os fundos comunitários, menosprezou a importância da comparticipação norte-americana para o desenvolvimento da Região. Ao mesmo tempo, nunca foram seriamente acauteladas as implicações da saída das Lajes das forças dos Estados Unidos.

O LIVRE-Açores manifesta a sua solidariedade para com os trabalhadores que ainda se encontram afectos à Base das Lajes e exorta os Governos Regional e Central
  • para concertarem uma estratégia de recuperação das valências da Base Aérea nº 4. A saída das forças militares Americanas da Base das Lajes não pode significar o fecho da mesma, com o consequente despedimento de todos os trabalhadores.
  • a manterem os esforços para encontrar uma solução para a respectiva reintegração na vida activa.

O LIVRE-Açores considera que a falta de planeamento a longo prazo e a recusa de um modelo de desenvolvimento regional baseado nos recursos endógenos, que reduza a dependência das “vontades” de terceiros, volta a colocar os Açores numa situação de reagir perante os factos. Improvisa-se onde se devia agir proactivamente. Os desafios que se colocam à Região nos contextos nacional, europeu e global não se compadecem com este tipo de políticas.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Aplicação de herbicidas na via pública: um mal necessário?


Os produtos fitofarmacêuticos são uma ferramenta importante para qualquer agricultor profissional pois permitem combater pragas e doenças que atacam as culturas e que, se não forem travadas, podem destruir por completo os produtos agrícolas. Mesmo na agricultura biológica, certos produtos fitofarmacêuticos podem ser utilizados na ajuda à produção.
Contudo, a sua utilização segura tem de respeitar regras, já escritas na lei 26/2013, de modo a preservar o meio ambiente e a saúde de seres humanos e animais. Além disso, o produto é o último degrau que deve ser subido na protecção de uma cultura, sendo que, antes da sua aplicação, existem muitas medidas preventivas que o agricultor tem de tomar, quer seja na escolha do local para a plantação de uma certa espécie ou na definição do espaçamento entre plantas, por exemplo. E se, é mais ou menos fácil de entender a necessidade de recorrer a produtos fitofarmacêuticos na agricultura, a aplicação de herbicidas em espaços públicos já me parece bastante questionável.

Depois de vários meses de chuva na ilha do Faial, eis que chegam dois dias seguidos de sol e, com eles de mão dada, a vontade da Câmara Municipal da Horta incubir os seus funcionários de “sulfatar” as ruas da cidade. E ainda antes de percebermos se é legítimo ou não aplicar herbicidas em espaços públicos, a forma despreocupada como se aplicam estes produtos é, no mínimo, assustador.
Em primeiro lugar, os funcionários que estão a pulverizar pavimentos não têm qualquer tipo de equipamento de protecção individual, pondo desde logo em perigo a sua própria saúde. Além disso, a sua formação deve ser escassa, já que na pausa das 9 da manhã, levam os dedos à boca para assobiarem ao colega, a chamá-lo para irem todos beber o seu café (ou mini, de acordo com os gostos). Ou seja, a substância que estão a pulverizar, além de estar nas suas roupas e mãos e boca, passa a estar no balcão da pastelaria onde são servidas refeições e bebidas.
Em segundo lugar, não existe qualquer sinalização ou limitação de circulação nos espaços onde estão a ser aplicados estes produtos, pondo em risco a saúde de todos os que por ali passam, incluindo uma criança que cai e leva as mãos à boca ou mesmo animais de estimação que vão farejando o chão que pisam.
Por fim, se quem doseou as quantidades do produto utilizado não sabe o que está a fazer, pode estar a pôr em perigo o próprio meio ambiente, nas mais diversas formas.
Numa altura em que se aperta o cerco a aplicadores de produtos farmacêuticos, não deveriam ser as instituições públicas as primeiras a dar o exemplo?

No dia 29 de Janeiro, segundo dia de aplicação, questionei a Câmara Municipal da Horta, na qualidade de cidadão açoriano, sobre que tipo de produto estava a ser aplicado e alertando para os perigos de se aplicarem produtos tóxicos da forma como o estão a fazer. Coloquei em conhecimento a Secretaria Regional da Saúde, a Secretaria Regional da Agricultura e Ambiente, os Serviços de Desenvolvimento Agrário do Faial e a Quercus, através do seu Núcleo Regional em S. Miguel. Até à data, apenas a Direcção Regional de Saúde deu resposta, incutindo a Delegação de Saúde da Horta de tomar as devidas medidas.

Relativamente à necessidade de aplicação de herbicidas em espaços públicos, a Quercus deixa no seu sítio da internet algumas sugestões alternativas, havendo já duas freguesias açorianas que optaram por não usar estes produtos no combate às infestantes.

O Arquipélago tem um património natural imensurável e temos de exigir às Câmaras Municipais açorianas mais cuidado com a nossa saúde e com a do meio ambiente, caso contrário, seremos todos responsáveis, pela via do silêncio.

domingo, 7 de fevereiro de 2016

Para melhor, está bem. Para pior, já basta assim.



O mês de Janeiro terminou com a primeira ronda de reuniões entre o Governo Regional dos Açores e os partidos políticos, sobre o processo de revisão do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores.
Esta ideia já tinha sido lançada, no ano passado, pelo Presidente do Governo Regional no seu discurso aquando das celebrações do Dia da Região, onde apresentou 3 pontos essenciais para discussão e revisão:
1.       Composição da Assembleia abrindo a possibilidade de haver candidaturas subscritas por listas de cidadãos independentes à Assembleia Legislativa da Região, bem como um sistema de listas abertas;
2.       Organização administrativa apresentando uma alteração às competências dos Conselhos de Ilha, que passariam a ter poderes executivos;
3.       Modelo constitucional da nossa Autonomia onde é defendida, claramente, a extinção da figura do Representante da República, sendo considerada a possibilidade se vir a criar um outro órgão regional em sua substituição.
Destes três pontos, e tendo em conta o que tem saído nos jornais, os partidos que foram ouvidos até ao momento e que são os mesmos que têm assento parlamentar, apenas comentam a extinção da figura do Representante da República e a transformação dos Conselhos de Ilha em “Governos de Ilha”, sendo que sobre este último referem unicamente que são contra. Até ao momento, apenas o PPM se manifestou a favor da possibilidade de haver listas eleitorais subscritas por cidadãos independentes e do sistema de listas abertas.

Relativamente ao primeiro ponto, devo saudar entusiasticamente a intenção de abrir as candidaturas a listas de cidadão independentes. Apesar de esta possibilidade estar sujeita, não só à revisão do nosso Estatuto Politico - Administrativo, mas também à revisão da Lei eleitoral, que não depende de nós, mas sim do Governo Central, celebro o facto de começar a haver partidos que finalmente percebem que a democracia só funciona quando os cidadãos participam activamente na vida politica.
No que diz respeito às listas abertas, e uma vez que a ideia é que seja o eleitor, no dia das eleições, a ordenar os candidatos das listas de acordo com a sua preferência, corremos o risco de aumentar ainda mais as taxas de abstenção e o número de votos nulos. Imaginem-se numa cabine de voto a ter que ordenar todos os candidatos de todos os partidos… Pois é, à terceira escolha já desisti.
Para melhorar a democracia, aumentar a participação cívica e diminuir as taxas de abstenção, porque não começar por implementar o voto electrónico? Ou abrir ao debate público os assuntos que são fundamentais para o desenvolvimento, progresso económico e protecção dos recursos da Região, com orçamentos participativos, por exemplo.

Quanto à questão da organização administrativa, que se centra exclusivamente na transformação dos Conselhos de Ilha em órgãos executivos, a posição de todos os partidos ouvidos é contrária à do partido do Governo.
Vejamos, o Conselho de Ilha é um órgão consultivo composto pelos Presidentes das Assembleias e das Câmaras Municipais, quatro membros eleitos por cada Assembleia Municipal, três Presidentes de Junta de Freguesia, um representante do Governo Regional e representantes do sector empresarial, de movimentos sindicais, associações agrícolas e do sector das pescas, IPSS e da Universidade. Todas as sensibilidades da sociedade civil estão representadas no Conselho de Ilha.
Considerando as propostas apresentadas pelo Presidente do Governo Regional, estes Conselhos de Ilha passariam a ser eleitos e a ter competências executivas transferidas dos municípios das respectivas ilhas e competências delegadas pelo Governo Regional.
Se se pretende que não haja um aumento de órgãos políticos nem de burocracia institucional, será que a intenção desta proposta é extinguir as Câmaras Municipais e as Juntas de Freguesia?
Se a intenção é essa, julgo que este debate acaba antes de começar, pois para isso teria que haver uma alteração completa do actual panorama da administração local, com mais outra reforma, desta feita bem mais profunda e arriscada, e não me parece que seja praticável.

Finalmente, o modelo constitucional da Autonomia, todos são da opinião de que o cargo do Representante da República deve ser extinto, entre outras razões, porque não é eleito, mas sim nomeado pelo Presidente da República. No entanto defendem a necessidade de se esclarecer a quem devem ser atribuídos os seus poderes. Por exemplo, o PSD defende a criação de um Presidente dos Açores e o CDS-PP pergunta se esses poderes passarão para o Presidente da Assembleia Legislativa Regional.
Gostaria de chamar a atenção para os poderes do Representante da República. Muito resumidamente ele:
Nomeia o Presidente do Governo Regional; Nomeia e exonera os membros do Governo Regional; Assina e envia para publicação os Decretos Legislativos Regionais (DLR); Exerce o direito de veto e pode pedir a fiscalização preventiva da constitucionalidade de qualquer norma de DLR.
Sendo estes os poderes do Representante da República e se temos um Presidente da República, eleito por sufrágio universal, que tem os mesmos poderes a nível nacional, parece-me redundante esta duplicação de funções e de figuras do Estado.


O debate sobre a revisão do Estatuto Político-Administrativo da RAA ainda vai no adro, mas já fez correr alguma tinta. É importante que se alargue a toda a sociedade civil e que quem quiser participar, tenha verdadeiramente essa possibilidade. As sessões de esclarecimento e de debate, que se devem realizar em todas as Ilhas do Arquipélago, devem ser amplamente divulgadas, de modo a que haja uma participação activa e construtiva, porque estamos a falar, essencialmente em dois dos pontos, em questões que podem alterar, esperemos que positivamente, o funcionamento da politica e a intervenção cívica de cada um de nós.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Um emprego digno como chave para a inclusão.


Os recentes resultados indicam para a última eleição presidencial que abstenção no estrangeiro atingiu 95,5%.

Como causas apontam-se as usuais mas, certamente que a burocracia não facilitará que um cidadão português no estrangeiro cumpra os seus direitos de cidadania; aliás, todos conhecemos as dificuldades impostas pelos actuais procedimentos administrativos em vigor para os residentes no país e que deveriam ser motivadoras, sobretudo para os jovens que estudam fora da sua zona de residência e eleitoral.

No entanto existem outros factores relevantes como a baixa escolaridade e a pobreza, tantas vezes de mão dada e, que só por si condicionam fortemente o interesse, a motivação e a disponibilidade para uma participação cidadã. Ou, dito de outro modo: a pobreza exclui!

E, nos anos recentes, o aumento do número de indivíduos e/ou famílias em condições de pobreza aumentou grandemente: no terceiro trimestre de 2015, existiam 14 978 pessoas desempregadas nos Açores e, mais de 300 mil pessoas sem trabalho há mais de dois anos em todo o país. Também a desregulamentação das relações de trabalho com a imediata fragilização do empregado promovendo aquilo que classificamos como subemprego tem sido crescente: e é muito interessante ouvir o argumento da direita de antes este (subemprego) do que nenhum! 

Mas o emprego como chave da inclusão terá de ser sempre digno correspondendo às expectativas do desenvolvimento humano e social exigidas por um país democrático e solidário. 

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

Contra a abstenção, a democracia participativa


Mais um ato eleitoral, e novamente o vencedor de sempre: a abstenção. No país da revolução dos cravos, a democracia ainda apresenta sintomas de pouca saúde. No passado domingo, assistimos a uma abstenção superior a 50%, tendo a abstenção nos Açores atingido o valor inédito de 70%. Um tal desinteresse faz com que a legitimidade do ato eleitoral fique em causa. É um facto matemático que o novo Presidente da República não foi eleito por maioria absoluta dos portugueses recenseados. Teve a maioria de votos no universo dos votantes, ou seja, feitas as contas à abstenção, os votos que o candidato eleito arrecadou (2,4 milhões) representam apenas um quarto da população inscrita. É caso para dizer que quem não vota, vota na verdade por omissão. Ou seja, não votar é dar força ao partido/candidato mais votado.

Normalmente, são várias as causas apontadas para justificar a abstenção: mortos que ainda constam nos cadernos eleitorais, mas que por razões óbvias não conseguem ir votar; emigrados que não conseguem vencer a enorme barreira burocrática do recenseamento no estrangeiro; um sistema de voto completamente ultrapassado, numa era já apelidada de “4ª revolução industrial – a era digital”, em que um cidadão ausente da sua área de residência, mas em território nacional, se vê impedido de votar; eleitores apanhados pela propaganda que promove a abstenção; e cidadãos genuinamente sem interesse. Mais razões haverá, mas as que mais peso poderão ter são todas elas solucionáveis. 

A poucos meses de outro ato eleitoral, desta vez as Legislativas Regionais da RA dos Açores, será que algo irá ser feito? Na era da informatização, será que custa assim tanto cruzar a base de dados das certidões de óbito com os recenseamentos eleitorais? Será que mais uma vez iremos assistir à propaganda do “isto está vencido, de nada serve votar”? Num estado dito democrático, na verdade o povo tem pouco ou nenhum poder além do voto. Será que nos podemos dar ao luxo de o desperdiçar? 

Fica desde já o nosso compromisso em trabalhar para uma democracia sempre mais participativa e acessível a todos, onde o poder seja realmente dos cidadãos e não das máquinas partidárias e respetivos gabinetes de propaganda. No Parlamento manda o povo, os assentos parlamentares não estão sujeitos a privatizações. Por que razão não pode um cidadão livre e independente candidatar-se a deputado? Será que os partidos merecem a exclusividade do acesso à Assembleia Regional?

domingo, 31 de janeiro de 2016

Reduzir, Reutilizar e Reciclar, por essa ordem


Querer pensar no lixo seria no mínimo estranho, pouco criativo ou até parecer coisa de “rating”, não fosse este um problema com o qual lidamos de forma muito pouco ambiciosa.
Isso reflecte-se na opção pela construção de duas incineradoras: na Terceira e em S. Miguel, estando a primeira praticamente concluída e já em fase de testes.
Para a incineradora da Terceira, cuja empresa gestora Teramb (Empresa Municipal de Gestão e Valorização Ambiental da Ilha Terceira) gere ainda o aterro intermunicipal da Ilha Terceira, prevê-se o processamento anual de cerca de 66 mil toneladas de resíduos provenientes das ilhas dos Grupos Central e Ocidental (http://www.azores.gov.pt/Gra/srrn-residuos/menus/secundario/PEGRA/).
Havendo desde o início a suspeição da possibilidade de incineração de resíduos em bruto, o que implicaria o não cumprimento das metas de reciclagem até 2020 para a ilha Terceira, a QUERCUS apresentou queixa à Comissão Europeia do incumprimento da legislação comunitária na avaliação do impacte ambiental deste projecto de incineração (também apresentou queixa para o projecto da incineradora de S. Miguel) em 8 de Maio de 2014.
 Por outro lado, os municípios de S. Miguel terão justificado a incineradora na sua ilha com a “existência de mais de 472 incineradoras em toda a Europa” (LUSA  11/11/2014 - 12:13); lamentavelmente só nos Açores passará a haver duas!
Ficam por pensar e debater outras alternativas, como por exemplo o tratamento mecânico e biológico (TMB) que certamente trariam mais benefícios ambientais e sendo uma mais valia para um desenvolvimento sustentável.
E, claro está: Reduzir, Reutilizar e Reciclar!


domingo, 24 de janeiro de 2016

É necessário descarbonizar a economia Açoriana

2015 foi o ano mais quente à escala global, desde que há registo. Antes dele, o ano mais quente alguma vez registado no planeta foi… 2014! E 15 dos 16 anos mais quentes de sempre foram registados desde 2001.

Assusta estarmos a ver o aquecimento global a acontecer, mas assusta ainda mais a passividade dos cidadãos e das entidades. Quando os melhores cientistas, famosos pela linguagem cautelosa que utilizam, descrevem cenários de pesadelo nos seus relatórios às Nações Unidas, todos devíamos passar noites sem dormir, preocupados com o mundo que está a ser preparado para os nossos filhos.

Em boa hora, portanto, se realizou na passada semana em Ponta Delgada a primeira de uma série de reuniões dedicadas a ouvir agentes públicos e privados no contexto da elaboração do Plano Regional para as Alterações Climáticas (PRAC). Este Plano, previsto desde 2011 na Estratégia Regional para as Alterações Climáticas, irá estar finalmente pronto em 2017.

Um dos condicionantes do PRAC será seguramente o compromisso firmado pela Região, no âmbito do acordo Under 2 MOU de, até 2050, reduzir as emissões de gases com efeito de estufa a 80-95% dos níveis de 1990, ou ter um nível de emissões anual inferior a 2 toneladas de CO2 por pessoa.

Assumindo (por falta de dados regionais atualizados) que o balanço de CO2 nos Açores acompanhou o todo nacional, este compromisso peca por falta de ambição. De facto, em boa parte devido à política de austeridade, as emissões líquidas de gases com efeito de estufa têm vindo a diminuir em Portugal desde o início do século, e situam-se já abaixo dos níveis de 1990.

Fonte: Memorando sobre emissões de CO2e, Agência Portuguesa do Ambiente

O PRAC tem que preconizar uma rotura com o modelo de desenvolvimento que nos trouxe à beira do abismo. É urgente apontar para a descarbonização total da sociedade açoriana, e fazê-lo muito antes de 2070, o limite apontado pelos estudos científicos à escala global. Isso não pode ser feito com medidas fáceis, e muito menos esperando pela magia da resposta dos mercados aos incentivos que lhes sejam acenados.

Descarbonizar os Açores deverá ter como principais eixos de ação:

  • reforçar a infraestrutura pública de energias renováveis, eliminado as centrais termo-elétricas em todo o arquipélago;
  • reduzir fortemente o consumo de energia, investindo no aumento da eficiência energética e na melhoria dos comportamentos energéticos dos equipamentos e dos agentes
  • apostar vigorosamente numa rede de transportes públicos baseada em veículos elétricos, acompanhada da penalização agressiva dos motores de combustão e do favorecimento da locomoção pedonal e em bicicleta;
  • fomentar a microgeração e a produção local de energia elétrica, estimulando a microgeração e a criação de cooperativas locais de produção de energia a partir de fontes de energia renovável de baixo impacto ambiental.